domingo, 26 de setembro de 2010

A CIJ examina um caso de imunidade de jurisdição do Estado

A Corte Internacional de Justiça examina um caso entre dois Estado Europeus, com base em uma Convenção do Conselho da Europa (não confundir com o Conselho Europeu!, órgão político da União Européia): a imunidade de jurisdição da Alemanha diante de tribunais italianos em um debate que exclui o Direito Comunitário. Eis aqui um caso em que diversos "Direitos Internacionais" ou "Regionais" (Privado, Público, Comunitário) se cruzam e cedem passagem

A CIJ não autorizou a ação reconvencional da Itália contra a Alemanha no caso iniciado por esta última em dezembro de 2008

Em uma decisão de 2 de julho último, a Corte Internacional de Justiça negou o pedido reconvencional da Itália contre a Alemanha no caso “Imunidades de Jurisdição do Estado (Alemanha c. Italia)”, pelo motivo principal da incompetência ratione temporis da Corte: o tratado invocado (Convenção Européia para a Solução Pacífica de Controvérsias) contendo a cláusula de jurisdição prevendo a competência da CIJ só entrou em vigor em 18 de abril de 1961 entre os Estados em questão. Ora, os fatos indicados na ação de reconvenção são anteriores a tal data (contrariamente aos fatos indicados pela Alemanha em sua ação principal, veja resumo desta última abaixo).


O Juiz brasileiro da Corte, Juiz Cançado Trindade, redigiu uma opinião dissidente, se baseando, entre outros elementos, na figura central dos indivíduos como sujeitos de Direito Internacional Público. Você poderá consultar a opinião dissidente do Juiz Cançado Trindade no site da Corte: http://www.icj-cij.org/docket/files/143/16028.pdf.

Resumo do caso iniciado em dezembro de 2008

Alemanha deu início, em 23 de dezembro de 2008, a uma ação diante da Corte Internacional de Justiça contra a Itália por violação de sua imunidade como Estado soberano. Segundo aquele país, a Itália violou, através de sua prática judiciária, certas obrigações decorrentes do Direito Internacional com relação à Alemanha.

Em seu pedido, a Alemanha indicou que nos últimos anos a Justiça italiana tem se recusado a considerar a imunidade característica de um Estado soberano. Ainda segundo a Alemanha, tal tendência atingiu um ponto crítico no processo Ferrini diante a Corte de Cassação italiana, que, em um acórdão de 11 de março de 2004, declarou competentes os tribunais italianos no que diz respeito ao exame de pedidos apresentados por indivíduos que, durante a Segunda Guerra Mundial, haviam sido deportados para a Alemanha para exercer trabalhos forçados no setor de armamentos. Após tal decisão de 2004, os tribunais italianos têm lidado com muitos outros casos contra a Alemanha, casos esses também iniciados por pessoas tendo também sofrido em decorrência do conflito armado mundial.

Visto que o acódão Ferrini fora confirmado por uma série de decisões de 29 de maio de 2008, assim como por um novo acórdão de 21 de outubro de 2008, a Alemanha indicou seu receio de que centenas de novos casos apareçam. Bens da Alemanha estavam, aliás, sendo bloqueados pela justiça. Foi o caso da Villa Vigone, centro germano-italiano de intercâmbio cultural, que se encontra sob hipoteca judiciária em vista dos processos em andamento. Além das ações iniciadas por italianos, a Alemanha mencionou igualmente algumas tentativas de cidadãos gregos de obter execução, na Itália, de decisões concedidas na Grécia em virtude de um massacre por unidades do exército alemão durante a sua retirada em 1944.

Segundo a Alemanha, a Itália tem violado sua imunidade de jusrisdição sob differentes ângulos. Primeiramente, aceitando ações cíveis com base em violações do direito internacional humanitário cometidas pelo Reich alemão durante a Segunda Guerra Mundial, entre setembro de 1943 e maio de 1945; em segundo lugar,ao aplicar as medidas de execução visando a "Villa Vigoni" propriedade do Estado alemão na Itália; enfim, ao aceitar a execução em solo italiano de decisões gregas baseadas em fatos semelhantes.

A base de competência da Corte Internacional de Justiça indicada pela Alemanha foi o artigo 1 da Convenção Europeia para a solução pacífica das controvérsias adotada em 29 abril de 1957 pelos membros do Conselho da Europa, ratificada pela Itália em 29 de janeiro 1960 e pela Alemanha 18 de abril de 1961.

Enfim, a Alemanha indicou em seu pedido que, embora o caso seja entre dois Estados-Membros da União Europeia, a Corte de Justiça das Comunidades Europeias, situada no Luxemburgo, não tem competência para examiná-lo, visto que a disputa não é regida por nenhuma cláusula de jurisdição contida nos tratados sobre a integração europeia. Ela acrescentou que, fora desse "contexto específico", o regime de Direito Internacional Geral continua a ser aplicável às relações entre os Estados-Membros.

O pedido foi acompanhado de uma declaração conjunta aprovada no consultas realizadas entre os Governos da Alemanha e da Itália, em Trieste 18 novembro de 2008, em que os dois governos disseram que "compartilham os ideais de reconciliação, solidariedade e de integração que formam a base da construção europeia. "Nesta declaração, a Alemanha "reconhece plenamente o indescritível sofrimento infligido a homens e mulheres de Itália", durante a Segunda Guerra Mundial. A Itália, por sua vez, "respeita a decisão da Alemanha de pedir à Corte Internacional de Justiça que esta última se pronuncie sobre o princípio da imunidade do Estado [e] considera que essa decisão irá contribuir para esclarecer esta questão complexa".

Para mais informações sobre o caso, visite o site da Corte: http://www.icj-cij.org/.

4 comentários:

  1. Olá Juliana,

    tudo bem?
    Meu nome é Gabriel A. Faria, sou graduando em Direito na Universidade Federal do Espirito Santo e estou escrevendo minha Monografia sobre o voto dissidente do Juiz Cançado Trindade e a questão da Imunidade Jurisdicional estrangeira.

    Você tem documentos interessantes sobre o caso, além dos já disponibilizados no site do próprio Tribunal? Alguma referência/análise do próprio Cançado sobre o voto dele? Sei que o próprio voto já é um show de conhecimento. Qualquer material é bem vindo.

    Meu email é gabrielfaria@gmail.com

    Grato e saudações capixabas,
    Gabriel

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  2. Oi, Juliana,

    Assim como o Gabriel também farei minha monografia sobre esse tema. Se tiver algum documento interessante sobre o caso, agradeceria se pudesse me mandar. Meu email é rafaelfrg@hotmail.com

    grato pela atenção,

    Rafael.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Catherine Maia, Rafael do Prado, « Opinião dissidente do Juiz Cançado Trindade junto ao Acórdão da Corte Internacional de Justiça, de 3 de fevereiro de 2012, no caso das Imunidades Jurisdicionais do Estado (Alemanha c. Itália; Grécia (interveniente)): tradução do original em língua inglesa para língua portuguesa », Revista da Faculdade de Direito da Universidade Lusófona do Porto, vol. 4, 2014
    (http://revistas.ulusofona.pt/index.php/rfdulp/article/view/4510)

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