Origens

Haia é hoje considerada como a capital judiciária mundial. Com seus 476.000 habitantes, dos quais muitos functionários internacionais, trata-se da terceira maior cidade da Holanda. Nela estão situados vários organismos internacionais e nada menos do que seis tribunais internacionais, dos quais três são permanentes – a Corte Permanente de Arbitragem, a Corte Internacional de Justiça e o Tribunal Penal Internacional, e os três outros temporários – o Tribunal Irã-Estados Unidos, o Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia e o recém criado Tribunal Especial para o Líbano.

Muitos confundem, quando não os seis tribunais, pelo menos alguns dentre eles como a Corte Internacional de Justiça (CIJ), o Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia (TPII)  e o Tribunal Penal Internacional (TPI). Outros são pouco conhecidos, como o Tribunal Irã-Estados Unidos (TIEU) ou o mais recente dentre eles, o Tribunal Especial para o Líbano (TEL).

Esses tribunais ou cortes internacionais apresentam algumas semelhanças e várias diferenças. Assim, por exemplo, somente a CIJ e o TPII são tribunais das Nações Unidas, enquanto o Tribunal Especial para o Líbano é uma instituição mixta. A Corte Permanente de Arbitragem (CPA) e o Tribunal Penal Internacional são, quanto a eles, organizações independentes, embora este último esteja ligado às Nações Unidas por uma acordo especial .

Dentre os tribunais permanentes, o mais antigo deles é a Corte Permanente de Arbitragem, criada em 1899. São também permanentes a Corte Internacional de Justiça e o Tribunal Penal Internacional, este último tendo concretizado o projeto de luta contra a impunidade numa escala quase universal, tal qual imaginada pelo Tribunal Militar Internacional de Nuremberg no fim da Segunda Guerra Mundial.

A Corte Permanente de Arbitragem foi estabelecida pela Convenção para a Solução Pacífica de Controvérsias de 1899, redigida durante a primeira Conferência de Paz de Haia. Esta última foi realizada sob a iniciativa do Csar Nicolau II da Rússia “com o objetivo de procurar meios objetivos para garantir a todos os povos os benefícios de uma paz real e duradoura e, acima de tudo, de limitar o desenvolvimento progressivo das armas de guerra existentes”. O mais contreto – e o mais importante – sucesso da Conferência foi o estabelecimento da Corte Permanente de Arbitragem como primeiro mecanismo de solução de controvérsias entre Estados. O texto de 1899, que serviu de base para a Corte, foi revisto pela Convenção de 1907 oriunda da Segunda Conferência de Paz de Haia. O Brasil ratificou a primeria em 15 de junho de 1907 e a segunda em 6 de março de 1914 .

A Corte Internacional de Justiça é, quanto a ela, o principal órgão judiciário das Nações Unidas. Suas atividades começaram em 1946, quando substituiu a Corte Permanente de Justiça Internacional que havia funcionado, sob a égide da Liga das Nações, no mesmo local, desde 1922. Ela é regida por seu Estatuto que é parte integrante da Carta das Nações Unidas, assim como por seu Regulamento interno. Qualquer Estado fazendo parte das Nações Unidas tem o direito de submeter um litígio à Corte. Quanto aos pareceres consultivos, somente cinco órgãos e dezesseis instituições especializadas do sistema das Nações Unidas estão habilitadas para pedi-los. Quando a Corte recebe um pedido de parecer, ela indica quais Estados e organizações são suscetíveis de lhe fornecer informações sobre a questão, sob forma escrita ou oral durante audiências. Se o procedimento consultivo se inspira do procedimento contencioso, seus pareceres não são obrigatórios.

Enfim, o Tribunal Penal Internacional foi criado pelo Estatuto de Roma, adotado em 17 de julho de 1998 por cento e vinte países tendo participado da Conferência diplomática dos plenipotenciários das Nações Unidas para o estabelecimento de um tribunal penal internacional. Trata-se do primeiro tribunal penal permanente instaurado por um tratado elaborado para promover a primazia do Direito e para assegurar que os crimes internacionais mais graves não permaneçam impunes. A 60ª ratificação necessária para a criação do Tribunal foi recebida em 11 de abril de 2002 e o Estatudo do Tribunal entrou em vigor em 1º de julho de 2002. Atualmente, cento e dez países ratificaram o Estatuto, a República Tcheca sendo o último a tê-lo feito em 21 de julho de 2009. O Brasil assinou o Estatuto em 7 de fevereiro de 2000 e seu instrumento de ratificação foi depositado no dia 20 de junho de 2002 .

A mais antigo tribunal temporário de Haia, o Tribunal Irã-Estados Unidos, está finalizando suas atividades. Os outros dois tribunais são de natureza penal: trata-se do Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia, que deverá terminar suas atividades em 2012, e o recentemente criado Tribunal Especial para o Líbano.

O Tribunal Irã-Estaos Unidos é um dos mais interessantes tribunais internacionais. Sendo pouco conhecido, gostaríamos de relatar suas origens em mais detalhes. Ele foi criado pelos Acordos de Argel de 19 de janeiro de 1980 que pos fim à crise gerada pela tomada da Embaixada americana em Teerã no fim de 1979, durante a qual cinquenta e dois reféns americanos foram detidos durante meses por um grupo de iranianos ligados ao movimento revolucionário.

Esforços por parte do Secretário-Geral da ONU e do Conselho de Segurança foram em vão para solucionar a crise. Este último editou duas resoluções considerando a captura e a detenção dos reféns como uma violação do Direito Internacional aplicável aos agentes e missões diplomáticas e pedindo a liberação desses últimos . Uma resolução impondo sanções foi, entretanto, vetada pela União Soviética. Alguns dias depois, no dia 29 de novembro, os Estados Unidos acionaram o Irã diante da Corte Internacional de Justiça. Fazia parte do pedido a edição de medidas cautelares de proteção, concedidas pela Corte numa decisão de 15 de dezembro de 1979. Nesse meio tempo, uma tentativa de recuperação dos reféns pelos Estados Unidos não obteve sucesso.

Durante esse período, os Estados Unidos tomaram uma série de medidas internas a fim de exercer uma pressão econômica sobre o Irã e proteger a economia americana de eventuais ameaças iranianas de represálias. A mais importante dessas medidas foi o congelamento de valores financeiros iranianos nos Estados Unidos. Assim, foram bloqueados todos os bens iranianos e seus frutos, bem como todas as sociedades controladas por eles e pelo Banco Central do Irã sujeitos à jurisdição dos Estados Unidos. Foram também bloqueados bens pertencendo a indivíduos iranianos ou em posse desses últimos, igualmente submetidos à jurisdição americana.

No fim de 1980, o Irã se mostrou disposto a uma solução pacífica da crise, visto que as medidas tomadas pelos americanos começaram a pesar sobre a economia daquele país e que a tomada dos reféns começou a ser intensamente criticada pela comunidade internacional. Várias possibilidades de negociações foram examinadas. A mais importante delas foi a iniciativa do governo argelino de atuar como intermediário e sua aceitação, de bom grado, pelos dois países interessados. Assim, no dia 2 de novembro de 1980, a Assembléia Consultiva Islâmica do Irã (Majlis) estabeleceu quatro condições, comunicadas ao Estados Unidos pelo embaixador argelino, para a liberação dos reféns. No dia 19 os Acordos de Argel foram assinados pelo representante plenipotenciário dos Estados Unidos e pelo Ministro iraniano para assuntos executivos.

O Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia foi estabelecido pela resolução 827 do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Tal resolução foi adotada em 25 de maio de 1993 como uma resposta à ameaça à paz e à segurança internacional representada por violações graves de Direito Internacional Humanitário cometidas no território da ex-Iugoslávia desde 1991.

Mais recentemente, o Conselho de Segurança adotou em 30 de maio de 2007 a resolução 1757 criando o Tribunal Especial para o Líbano. Trata-se do último tribunal criado pela Organização das Nações Unidas. Tal criação reitera o poder do Conselho de Segurança de criar tribunais especiais. Uma verdadeira discussão surgiu em torno do caráter internacional ou não do Tribunal. As conseqüências jurídicas de tal classificação não são sem interesse. Vários critérios podem concorrer para a resposta a essa questão: o direito aplicável – interno ou internacional – a sua composição, etc.

Embora tenha sido inspirado dos precedentes tribunais penais internacionais ad hoc criados pela Organização das Nações Unidas – dentre os quais o Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia – ele contém essa particularidade de ter como direito aplicável unicamente o Direito interno libanês . Esta definição é importante pois ela exclui a possibilidade de assimilar os fatos incrimináveis a crimes realmente internacionais como "crimes contra a humanidade", o que teria como conseqüência um extensão da competência do Tribunal a fatos ocorridos em território libanês em meados de maio de 2006. Tal exclusão foi deliberada e foi o resultado de discussões no seio do Conselho de Segurança da ONU.